quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

"Futebol Acromático"


No ano de 1982, o Internacional-RS tinha em seu plantel um meia muito talentoso chamado Cléo. Acreditando que o país exibia uma aura que tendia à liberdade, o atleta deu uma corajosa entrevista para a Revista Placar, dizendo que tivera relações homossexuais assumidas e tranquilas.
Quando deu a declaração, o jogador já estava vendido para o Barcelona. A notícia caiu como uma bomba na Espanha. Cléo acabou atuando apenas três meses pela equipe da Catalunha, logo cedendo sua vaga de estrangeiro a um certo Diego Armando Maradona.
O meia passou a ser avaliado mais pela sexualidade do que pela habilidade com a bola. Em julho de 1982, o jogador já dava mostras de ter se arrependido de mostrar sua vida pessoal. “Quero que essa história de homossexualismo caia logo no esquecimento”, disse Cléo, na ocasião de uma recusa de entrevista para a Revista Playboy. A história jamais caiu no ostracismo. Além de ter recebido o maldoso apelido de Farah Fawcett (uma renomada atriz da época), entradas ríspidas e demais provocações passaram a ser parte do cardápio de suas jornadas nas quatro linhas. O resultado é que a carreira só durou até os 28 anos, quando ele a encerrou por conta de uma lesão no joelho.
Outro caso mais recente é do versátil Richarlyson, revelado pelo Ituano e consagrado pelo São Paulo, o meia/volante/lateral também passou por agruras semelhantes por conta de sua suposta orientação sexual. No entanto, no caso de Ricky, não foi ele que revelou qualquer detalhe íntimo.
No dia 26 de julho de 2007, o diretor palmeirense José Cyrillo Júnior, em um programa televisivo com o apresentador Milton Neves deu a entender que Richarlyson era um jogador que ainda não havia assumido sua homossexualidade. Atitude que rendeu um processo para Cyrillo e muitas perseguições para Richarlyson. Perseguições que incluíram a recusa de uma organizada tricolor em gritar o nome do jogador antes dos jogos. E a mesma rejeição voltou a acontecer no Atlético-MG.
O último time de Richarlyson foi o FC Goa, da India, treinado por Zico. Apesar de ele ter colocado o interesse de clubes dos principais torneios, o atleta segue sem destino definido para 2017. A única certeza é que Ricky seguirá ouvindo desaforos no mundo homofóbico do futebol.
Na contramão de toda essa barbárie, o futebol espanhol, em dezembro de 2016, através de quatorze clubes, manifestou toda a sua solidariedade aos grupos gays e fez uma campanha contra a homofobia. Capitães de clubes como Sevilla, Eibar, Leganés, Granada, Espanyol e Las Palmas portaram braçadeiras com as cores do arco-íris para representar a causa. É uma gota de água no meio desse deserto de preconceito, mas vale muito a intenção de aliviar o calor da ignorância.
   Recentemente, o presidente Eurico Miranda, do Vasco da Gama, deu uma entrevista polêmica para Antônia Fontenelle. Entre outros depoimentos pirotécnicos, o mandatário vascaíno afirmou que “futebol é coisa de homem” e não deve ser apitado por gays.
Lembramos ao presidente cruzmaltino que o Vasco foi o clube que abriu as portas para as minorias em 1923. Nunca discriminou ninguém. As afirmações de Eurico são contrárias ao conceito de um esporte que tem a função de integrar. Os gays, as mulheres e quem mais quiser podem e devem praticar qualquer função no meio futebolístico. Essas colocações é que afastam os jogadores profissionais da ideia de se revelarem em meio essencialmente machista e discriminatório. Apenas oito jogadores foram capazes de assumir publicamente. E nem todos acabaram bem suas jornadas. Outros têm receio de passarem pelo mesmo calvário que Cléo e Richarlyson.






Nenhum comentário:

Postar um comentário